Política
Campo progressista não pode romantizar segurança, diz Contarato
O senador do PT Fabiano Contarato, eleito para presidir a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Crime Organizado, defendeu que é preciso mudar o “estigma” de que o “campo progressista” defende apenas os direitos humanos dos presos.
“Direitos humanos é muito amplo. Mas, durante muito tempo, ficou esse estigma de que nós defendemos pessoas que violaram qualquer âmbito criminal. É isso que tem que ser mudado”, afirmou.
Delegado da Polícia Civil por 27 anos no Espírito Santo, o presidente da CPI instalada nesta semana no Senado falou com exclusividade à Agência Brasil.
O parlamentar defende o endurecimento de penas para adolescentes em conflito com a lei, critica a saída temporária de presos condenados por crimes contra a vida, não vê problema em equiparar as facções ao terrorismo e acredita que o “campo progressista” não pode romantizar o tema da segurança pública.
“Passou da hora – e isso é público e notório – de o campo progressista começar a falar com responsabilidade, com os pés no chão e sem romantizar essa área, para dar uma resposta à sociedade”, afirmou.
Eleito senador em 2018 pelo partido Rede, Contarato se filiou ao PT em 2022 e tem atuado em temas ligados à segurança pública. Ele disse que vai trabalhar para evitar que a comissão seja dominada por disputas eleitorais.
Confira a entrevista completa abaixo:
Agência Brasil: Como o senhor pretende evitar, como presidente, que a CPI seja capturada por uma disputa eleitoreira, entre governo e oposição, em vez de construir propostas para combater o crime organizado?
Fabiano Contarato: Tenho a plena convicção que tanto eu, como presidente, como o senador Alessandro Vieira [o relator], ambos egressos da Polícia Civil como delegados de polícia, bem como o vice-presidente da CPI, que é o senador Hamilton Mourão, queremos focar esse trabalho de forma mais técnica, de forma mais objetiva e sem pirotecnia, sem ficar deixando se levar para um comportamento mais ideológico e partidário.
É legítimo que um parlamentar queira fazer uso dessa CPI para isso [disputa político-eleitoral], mas o que eu puder fazer para evitar esse tipo de comportamento não tenho dúvida de que assim farei.
Importante ressaltar também que aqui no Senado essa relação entre os colegas é muito respeitosa. A gente tem que ter a responsabilidade de dar uma resposta para a população sem se deixar contaminar com esse viés político partidário ou eleitoral.
Temos que fazer dessa CPI um resultado positivo em defesa daquilo que é elementar, que é a segurança pública como direito de todos e dever do Estado.
Agência Brasil: As posições politico-ideológicas entre governo e oposição são muito divergentes em relação ao tema da segurança pública. É possível encontrar alguma convergência na CPI para construir uma proposta comum?
Contarato: Eu aceitei ser presidente dessa comissão com o pré-requisito de não renunciar às minhas convicções. Eu fiquei 27 anos trabalhando na ponta da segurança pública. Eu leciono, desde 1999, disciplinas de direito e processo penais.
Passou da hora – e isso é público e notório – de o campo progressista começar a falar com responsabilidade, com os pés no chão e sem romantizar essa área, para dar uma resposta à sociedade.
Segurança pública não deve ser tratada com uma pauta exclusiva da direita ou do campo conservador. A gente tem que entender que segurança pública é uma pauta de todos os partidos políticos, independentemente da colaboração partidária.
Eu era líder do PT no Senado quando foi avaliado manter ou não o veto da chamada saidinha, que é a saída temporária de presos. Argumentei que um homicídio doloso por disparo de arma de fogo, que tem pena de seis a 20 anos de reclusão, tem a tendência de condenar a pena mínima, mas vamos supor que não condenou a seis anos, condenou a nove anos.
Com um sexto da pena, aquele autor daquele homicídio com disparo de arma de fogo já sai em regime aberto. Se vai dar ainda 35 dias de saída temporária para um condenado que violou o principal bem jurídico? Não é razoável.
É preciso se colocar no lugar daquela mãe que perdeu um filho por disparo de arma de fogo. Se a pessoa foi condenada a nove anos de reclusão, não vai ficar nem um ano e oito meses preso.
Na época dessa votação, era líder do PT e falei que, se isso acontecesse, eu não poderia renunciar às minhas convicções e iria votar pela derrubada do veto. E foi isso que aconteceu.
Agência Brasil: O senhor também foi relator do Projeto de Lei (PL) 1.473/2025, que aumenta a pena mínima para adolescentes em conflito com a lei que cometem violações graves.
Contarato: No Espírito Santo, um rapaz de 16 anos, com a arma do pai, que era policial militar, entrou numa escola atirando e matou quatro pessoas – uma estudante e três professoras. Deixou dezenas feridas. Agora, em novembro, ele completa três anos de internação e vai sair. Não é razoável.
O Brasil é o mais permissivo dentro do G20. O mais permissivo. E olha que eu estou falando das grandes democracias.
Então, aumentei o período de internação de três para cinco anos se ele praticar ato infracional com violência, grave ameaça, equiparado ao [crime] hediondo ou tráfico de entorpecente, esse prazo pode chegar a dez anos. Já foi aprovado aqui em decisão terminativa, está na Câmara.
Agência Brasil: Como o campo progressista peca em dar uma resposta à sociedade na área da segurança pública?
Contarato: Por que o campo progressista ficou rotulado que nós defendemos direitos humanos apenas para a população que está cerceada de sua liberdade de ir e vir? Nós temos que repensar isso.
Direitos humanos são todos os direitos que a pessoa tem, independentemente da raça, cor, etnia, religião, origem, orientação sexual. Direitos humanos é também para proteger as vítimas dos policiais que são alvejados no confronto lá no Complexo do Alemão, por exemplo.
Direitos humanos também são para atender aos órfãos dos feminicídios, que o Brasil é o que mais mata, que é para atender às vítimas de violência sexual.
Direitos humanos é [um conceito] muito amplo. Mas, durante muito tempo, ficou esse estigma de que nós defendemos, entre aspas, pessoas que violaram qualquer âmbito criminal. É isso que tem que ser mudado.
Eu aprovei aqui no Senado também o projeto transformando corrupção ativa, passiva, peculato, crimes contra a autoridade, contra o sistema financeiro em crimes hediondos.
Porque um político, quando desvia verba da saúde, ele mata milhões de pessoas. Um político, quando desvia verba da educação, ele mata milhões de jovens. Veja quanta coisa boa que a gente pode dar de forma propositiva, sem se deixar contaminar com essa coisa de que é da direita, porque é conservador.
Volto a falar: segurança pública, isso não sou eu que estou dizendo, está no Artigo 144 [da Constituição], é direito de todos e dever do Estado.
Agência Brasil: A oposição quer equiparar as facções criminosas ao terrorismo. Especialistas apontam que a medida abre caminho para intervenções dos Estados Unidos aqui no Brasil, como o senhor avalia esse tema?
Contarato: Não vejo essa possibilidade de intervenção de outro país na nossa democracia porque a nossa democracia é sólida, é forte, as instituições são firmes. O Executivo, o governo do presidente Lula, fortalece as instituições. Nós temos harmonia, autonomia e independência dos Poderes.
Nós aprovamos aqui, em 2023, a alteração da Lei de Terrorismo [PL 3.283/2021] e está também na Câmara dos Deputados, equiparando a atos de terrorismo as condutas praticadas, por qualquer razão, com finalidade de provocar terror social generalizado, em nome ou favor de organização terrorista ou grupo criminoso organizado, que elenca ali sete hipóteses.
Isso já foi aprovado e é uma resposta que o Parlamento já pode dar. Eu não vejo essa preocupação de que, se você fizer qualquer alteração na Lei de Terrorismo, isso vai legitimar para que outro país, como os Estados Unidos, que venha aqui.
Não, nós temos que dar uma resposta naquilo que a população está sentindo, e a população mais pobre é que sofre. É fácil para mim que sou homem, branco, engravatado, que tem saúde pública, que tem alimentação adequada, que tem plano de saúde.
Mas temos que nos colocar no lugar daquela mulher que está lá no morro, no Complexo do Alemão, e que tem que pagar para ter o seu comerciozinho, que tem que pagar para ter água, tem que pagar para entrar na comunidade, que tem que pagar para viver sendo subjugada, porque, quando o Estado não está presente, o medo se instala, e aí a barbárie se impõe.
Fonte: Agência Brasil
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